Foi-se o tempo em que o único método de avaliar a intelectualidade de um jovem era o Quociente de Inteligência (o QI). Essa classificação frustrava pais de crianças que não se encaixavam no modelo padrão de avaliação. Modelo limitador, pois não considera os demais tipos de inteligência.
A psicologia e o estudo do desenvolvimento humano constataram, por meio de diversas pesquisas, que é impossível limitar a inteligência humana a uma só. Indivíduos têm habilidades diferentes, o que naturalmente gera diferentes necessidades nos processos de aprendizagem.
Foi o psicólogo Howard Gardner que falou primeiro sobre a identificação de até nove tipos de inteligência distintos. São eles:
- Lógico-Matemática;
- Espacial;
- Musical;
- Linguística;
- Intrapessoal;
- Interpessoal;
- Corporal;
- Naturalista;
- Existencial.
A estes tipos, o também psicólogo Daniel Goleman adicionou a tão falada Inteligência Emocional. De qualquer forma, cada um desses tipos tem suas particularidades e dificilmente um ser humano contém apenas um tipo de inteligência.
É natural que algum tipo se sobressaia frente aos demais, mas eles basicamente funcionam de forma complementares. E, é claro, alguns deles precisam de mais esforço para serem desenvolvidos.
Independentemente do tipo, todas as inteligências apresentam um problema a ser resolvido, e a inteligência ligada àquela área é que permite que a criança proponha ideias ou inovações para solucioná-lo.
Inteligência Lógico-Matemática
Esta inteligência sempre esteve no eixo principal das avaliações das capacidades das crianças. Os testes de Q.I. inicialmente se dividiam em questões de linguística e de lógica.
Seus estímulos e habilidades começam nos primeiros anos de vida da criança, e vão evoluindo conforme o crescimento. A ideia central é sempre voltada para a inovação, ou seja, novas formas de fazer as mesmas ou novas coisas. Parece bastante com o que conhecemos da cultura maker, certo?
A montagem de blocos numa sequência lógica por crianças menores ou o levantamento de hipóteses e cálculos de complexidade diversas são algumas maneiras de estimular a inteligência lógico-matemática.
Por isso, algumas escolas utilizam ramos da matemática aplicada para desenvolver situações de lógica e raciocínio para crianças. Um bom exemplo disso é a teoria dos jogos, na qual situações são apresentadas para crianças de diversas maneiras, e elas precisam propor resoluções nas quais todos os “jogadores” ganham ou perdem menos.
Conheça 5 formas de desenvolver o raciocínio lógico do seu filho neste outro artigo.
Inteligência Espacial
Está ligada ao raciocínio a partir de um posicionamento ou de uma estrutura. É identificada em carreiras como a engenharia e se complementa à lógico-matemática.
Também é bem comum aparecer mais em arquitetos, artistas plásticos e pilotos de avião, cujo desenvolvimento das noções de espaço, objeto e posicionamento determinam uma construção ou trajetória.
O estímulo para essa inteligência contempla os questionamentos de formas e materiais, como construção de maquetes e quebra-cabeças. Atende basicamente quaisquer estudos realizados em ambientes físicos ou virtuais a partir de pontos estratégicos. Noções essas que jogos como o Minecraft estimulam a todo momento.
Inteligência Musical
Amy Winehouse, Kurt Cobain, Vance Joy, Elis Regina, Beethoven — não importa o gênero musical, todos eles possuem uma inteligência destacada em comum. Apreciar, estudar, compor e tocar são habilidades da inteligência musical.
Mas não apenas isso, ela também está associada aos grandes atores, devido ao trabalho de voz e diferentes timbres necessários para encenar sentimentos. Em qualquer um desses casos, é necessário saber ouvir, compreender e, principalmente, dominar sons para reproduzí-los com exatidão.
Pode soar estranho para alguns, mas esse processo criativo também está ligado à matemática (por meio das notas musicais). O melhor exemplo disso está na perfeição de uma orquestra em plena sintonia. Por isso, este tipo também está associado à inteligência lógico-matemática.
A importância das aulas de musicalização para crianças de até 5 anos, e de música para as com mais de 5 anos, vem daí. Até porque esses aspectos estão muito ligados à disciplina e perseverança, fatores essenciais para a vida adulta.
Inteligência Linguística
Outro conhecimento que sempre esteve presente no eixo de análises de capacidades, a inteligência linguística está associada ao aprendizado da fala, leitura e desenvolvimento de conteúdo na língua pátria e no aprendizado de outras línguas.
Profissionais como escritores, tradutores, jornalistas, juristas e diplomatas normalmente possuem essa inteligência bem desenvolvida. Os poetas também utilizam o recurso da sonoridade para a criação de suas obras e, por isso, também costumam ter a inteligência musical bem apurada — já imaginou ler Camões sem todas as métricas corretas?
Por ser explorada de forma mais intensa pelas escolas, a inteligência linguística vem passando por mudanças constantes pela forma de estimular as crianças em processo de aprendizagem, até porque as crianças se cansam facilmente de formas de ensino tradicionais.
Com as inovações e as tecnologias da nova era, outras formas de linguagem estão sendo criadas, e apresentá-las para as crianças de forma lúdica e envolvente também é importante e necessário para que elas acompanhem e façam parte dessa evolução.
Inteligência Intrapessoal
O reconhecimento de seus potenciais e limitações, dos seus sonhos e desejos é o ponto central da inteligência intrapessoal. Esta habilidade é importante para todas as áreas profissionais e pessoais de um indivíduo, pois o permite planejar seus objetivos ciente de quais arestas precisarão ser aparadas.
Ela normalmente é percebida em conjunto com uma das outras inteligências reconhecidas. Como em uma criança que tem o objetivo de comprar uma bicicleta por meio dos seus esforços de vendas de brigadeiros, por exemplo. Ela compreende que precisa ter um bom produto e ter a capacidade de vendê-lo. Mas se não tiver uma dessas duas habilidades, precisará encontrar outra maneira de conquistar seu objetivo.
Somando ao autoconhecimento, existe também a maior capacidade de manter-se confiante e motivado, pois ao saber escolher suas melhores habilidades para executar um plano, a criança terá consciência da possibilidade de sucesso ou não.
Estimular a inteligência intrapessoal é de extrema importância para o aspecto psicológico da criança. Ela precisa se sentir confiante em relação à suas habilidades e também ser capaz de compreender seus sentimentos frente a um problema. No caso da inteligência intrapessoal, o problema é o sentimento que a criança está sentindo, e buscar uma solução ou entendimento para este problema é a forma de exercitá-la.
Muitas vezes esse estímulo é obtido em consultas com psicólogos e terapeutas, algo bem comum porque, é claro, somos seres humanos e, portanto, somos complexos.
Inteligência Interpessoal
É o domínio da comunicação e das relações com outros indivíduos. A criança que possui essa habilidade mais desenvolvida tem mais empatia com outras pessoas e também demonstra ser mais simpática.
Por esses motivos, ela consegue envolver todos para buscar a solução do problema em conjunto e também se envolve mais nos dilemas de outras pessoas.
O indivíduo que possui a inteligência interpessoal bem desenvolvida é mais solidário e sabe entender as dificuldades dos outros. Com sua empatia, tenta ajudar na solução do problema do outro.
Promovendo senso de liderança e/ou habilidade de convencimento, a inteligência interpessoal possibilita que o indivíduo execute bem as funções políticas, de gestão, de psicologia e de terapias em geral, pois da mesma forma que consegue expressar bem suas ideias, também consegue compreender as outras pessoas e ajudá-las.
O estímulo é dado através de tarefas em grupo e também em projetos em que a oratória será explorada, como na apresentação de um trabalho escolar. Esse domínio interpessoal também está associado à inteligência linguística, pois é necessário compreender a melhor maneira de transmitir uma informação para envolver os outros interlocutores.
Inteligência Corporal
Ter pleno controle dos movimentos corporais: esse é o cerne da inteligência corporal. Em uma análise superficial, esse domínio seria atribuído a bailarinos e atletas das mais diversas modalidades. Mas ele também se aplica a cirurgiões e chefs de cozinha que precisam trabalhar com firmeza e perícia nos movimentos das mãos.
As crianças também recebem estímulos obrigatórios por currículo nas escolas, e muitos pais buscam atividades tradicionais extracurriculares como futebol, judô e ballet para estimular ainda mais estas habilidades.
Isso é muito positivo, pois o conhecimento corporal favorece a execução de todas as outras habilidades possíveis, além de trazer outros ensinamentos como a disciplina, o cuidado com a alimentação e o impacto que ela pode ter no desempenho do corpo.
As tecnologias atuais também ajudam a estimular cada vez mais o controle do corpo, desde os games de simulação de esportes, até mesmo os equipamentos que analisam a performance dos atletas que são os ídolos das crianças.
Inteligência Naturalista
Seguindo a lógica de Gardner na descrição de inteligência, que diz que ela é a forma com que a criança apresenta a solução para um problema, o domínio do conhecimento sobre a natureza e seus fenômenos é fundamental para geógrafos e agrônomos, que precisam extrair do meio ambiente todos os insumos de que a sociedade precisa, sem, contudo, destruir a fonte.
É preciso compreender os possíveis impactos ambientais das ações dos homens e sugerir medidas alternativas e menos destrutivas. Esta definição de inteligência foi incorporada posteriormente por Gardner, e é cada vez mais urgente explorar isto na mente das crianças.
Projetos escolares que envolvam a preservação do meio ambiente, a conscientização ecológica e a valorização do reaproveitamento são excelentes estímulos para provocar os questionamentos certos nas crianças.
Mais uma vez o problema da necessidade de preservação da natureza é apresentado a elas, e a busca por uma solução é o caminho para o desenvolvimento dessa habilidade.
Inteligência Existencial
O questionamento do seu real propósito. Alguns estudiosos relacionam com a fé e as crenças, mas ela também envolve o entendimento das motivações pessoais e das motivações que poderão mobilizar um grupo de indivíduos.
Filósofos e professores precisam exercitar diariamente este domínio de conhecimento para cativar seus alunos. E usar pensamentos de grandes filósofos e questões da atualidade também pode provocar reflexões nas crianças e adolescentes. Mais uma vez a Teoria de Jogos pode ser aplicada.
A Teoria das Inteligências Múltiplas e as Escolas Tradicionais
Como pôde ser visto, todas elas podem se complementar, e todas possuem uma aplicabilidade e uma forma de estimular. O currículo das escolas tradicionais precisaria de muitas alterações para englobar todos os nove tipos de inteligência propostos na Teoria das Inteligências Múltiplas.
Por isso, cada vez mais se torna necessário explorar conhecimentos extracurriculares, fazendo com que as crianças consigam compreender suas próprias habilidades desde cedo e se frustrem menos com modelos antigos de avaliação.
Temple Grandin, uma psicóloga com Transtorno do Espectro Autista e PHD em Agronomia, falou em sua palestra do TED que os cérebros normais ignoram os detalhes para compreender a informação como um todo, e que o cérebro dos autistas funcionava ao contrário, concentrando-se nos detalhes.
Essa perspectiva começa a mudar a partir do momento que se compreende que, identificando as inteligências de uma criança, é possível estimulá-la de maneiras diferentes, levando-a a compreender tanto o todo quanto os detalhes.
A nova proposta de estudo, que algumas escolas vêm testando ao redor do mundo, torna o período menos frustrante para a criança. Afinal, permite que ela desenvolva seu potencial em forma de projetos, com início, meio e fim.
É importante ressaltar que, com instrumentos simples e embasamentos corretos, crianças terão suas habilidades desenvolvidas e monitoradas em ambiente seguro, dentro dos limites que a idade permite.
Lidando com o tipo de inteligência do seu filho sem pressioná-lo
O ideal é proporcionar aos jovens todas as possibilidades de estímulos que o façam questionar os padrões e respostas atuais sem incluir expectativas suas enquanto mãe ou pai.
É preciso fazê-los pensar em respostas diferentes para um problema que já foi solucionado, permitir que vivenciem e experimentem as mais diversas maneiras de estimular cada uma dessas inteligências com total autonomia, ainda que sejam guiados durante estes processos.
No meio do papel das escolas tradicionais e das escolas que se propõem a ir além, cabe aos pais ensinar o certo e o errado tendo consciência de que isto é também provocar o sentimento de olhar para o mundo, para as pessoas, e ajudar.
Tags: tipos de inteligência